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Patrocínios milionários nas camisas de futebol: será que vale a pena?

  • Foto do escritor: José Nicolau
    José Nicolau
  • 13 de nov.
  • 3 min de leitura
À primeira vista, pagar centenas de milhões de dólares para colocar uma marca na camisa de um clube de futebol parece irracional. Como recuperariamos o investimento? Em quanto tempo?
Qualquer diretor financeiro hesitaria na frente desses números. No topo da Europa, esses números podem chegar na casa dos € 70 milhões anuais, como os valores pagos pela Emirates ao Real Madrid ou pelo Spotify ao Barcelona.

No Brasil, o movimento não é tão distante: o Palmeiras já recebeu mais de R$ 80 milhões anuais de Crefisa e FAM, e o Corinthians anunciou, antes da rescisão, um acordo de R$ 370 milhões em três anos com a VaideBet, substituído depois por um contrato de cerca de R$ 309 milhões em três anos com a Esportes da Sorte. A pergunta continua válida: por que tantos milhões por alguns centímetros de tecido?

por que tantos milhões por alguns centímetros de tecido?
por que tantos milhões por alguns centímetros de tecido?

A resposta mais simples é exposição. O futebol ainda entrega uma audiência que poucos veículos conseguem replicar. A Premier League soma mais de 3 bilhões de espectadores agregados por temporada, a Champions League ultrapassou 400 milhões de pessoas na decisão de 2024, e o Campeonato Brasileiro ainda consegue levar 30 milhões de espectadores às telas em momentos decisivos. Em termos de custo por impressão, os grandes patrocínios de camisa não são muito diferentes de campanhas globais de mídia digital. A diferença é que, no futebol, o impacto é mais denso. Não é só alguém “vendo um anúncio”; é alguém vendo a própria emoção estampada junto ao anúncio.

A força do patrocínio está justamente aí. A marca que aparece na camisa não ocupa só o campo visual: ocupa o campo afetivo. Ela aparece em cada foto no estádio, em cada vídeo caseiro de gol, em cada post espontâneo. Ela está presente nos álbuns de figurinhas, nos gols históricos, nos campeonatos vencidos e perdidos, nos momentos que o torcedor carrega por anos. Por isso, pesquisas indicam que três em cada quatro torcedores têm percepção mais positiva das marcas que patrocinam seu time. Não é uma lembrança publicitária: é transferência de lealdade.
Foi isso que empresas como Emirates, Etihad e Qatar Airways entenderam cedo. Elas não investiram apenas para vender passagens. Investiram para se tornar marcas globais: reconhecidas, comentadas e culturalmente presentes em mercados onde antes eram apenas nomes distantes. Transformaram o patrocínio de camisa em uma infraestrutura de reputação internacional. Hoje, é quase impossível imaginar o Real Madrid sem o Fly Emirates no peito ou o PSG sem a presença do Qatar em sua identidade comercial. O retorno é de construção de marca, numa visão de longo prazo.

No Brasil, o fenômeno assume outra dimensão, mas segue a mesma lógica. Marcas como Crefisa, Pixbet, Betano e Esportes da Sorte compraram mais do que espaço: compraram enredo.

Elas entraram na narrativa dos clubes, influenciaram ciclos vitoriosos, participaram de decisões esportivas e se conectaram a títulos que definem épocas. A Crefisa mais do que estampou a camisa do Palmeiras; ela se tornou parte da reconstrução que levou a Libertadores, Brasileiros e uma virada institucional profunda. Poucas campanhas publicitárias conseguem esse efeito de longo prazo. Pouquíssimas conseguem se tornar parte da memória coletiva de uma torcida.

Apresentação da antiga patrocinadora do Corinthians antes de toda polêmica
Apresentação da antiga patrocinadora do Corinthians antes de toda polêmica

Naturalmente, há tensões. O retorno financeiro direto é difícil de mensurar. Patrocínios podem confundir-se com mecenato, principalmente quando há interesses paralelos. E o risco reputacional é permanente. Quando o time entra em crise, a marca vai junto; quando o clube se envolve em escândalos, o patrocinador aparece na manchete. Foi exatamente o que ocorreu no caso da VaideBet com o Corinthians, um exemplo claro de como a exposição, quando vira problema, se transforma em passivo de alto custo.

Ainda assim, o mercado continua aquecido. E isso diz muito. Empresas listadas em bolsa, com governança rígida e pressão de resultados, não jogam centenas de milhões no escuro. Se elas continuam pagando caro para ocupar o peito de um clube, é porque o custo de oportunidade compensa. O futebol entrega algo que se tornou raro em um ecossistema de publicidade saturado: atenção massiva acompanhada de envolvimento emocional. Enquanto a mídia digital fragmenta audiências, enfrenta bloqueadores e disputa segundos de atenção, o futebol mantém um público semanalmente engajado, disposto a consumir, comentar e vestir a marca junto com o próprio clube.

No fim das contas, a pergunta “vale a pena?” já está respondida pelos números. Se não valesse, os valores estariam caindo, e não subindo em ritmo acelerado. O futebol continua sendo o encontro mais puro entre paixão e negócios, um espaço onde a cultura popular funciona como acelerador de reputação corporativa. E, nesse contexto, alguns centímetros de tecido continuam valendo milhões porque carregam algo que a publicidade não consegue comprar em nenhum outro lugar: pertencimento.
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